sábado, 17 de janeiro de 2015

Eles não querem liberdade

    É estarrecedor abrir a Folha de S. Paulo e saber que uma equipe de jornalismo foi lamentavelmente impedida de realizar seu trabalho porque autoridades da Indonésia a detiveram por alguns momentos e retiveram passaportes dos profissionais. Evidentemente é natural que eu, enquanto jornalista, sinta completa indignação com o episódio, mas nada é pior do que ler o inverso.
     Observar a opinião alheia é um hobbie bem particular, e como tal, sempre externo algumas conclusões verbalmente ou não. De modo que não é incomum constatar o quanto há de contradição nas pessoas de um modo geral. Quer dizer, ver centenas e centenas de internautas no gozo de sua ‘liberdade de expressão’ apoiar claramente e até defender o assassinato dos mesmos jornalistas é extremamente contraditório. Posto que enquanto concordam e defendem a tirania contra a liberdade de imprensa, o fazem unicamente porque são (ainda) providos de alguma liberdade.

    Isto, de todo modo reflete convergentemente para um termo que normalmente esses mesmos internautas saúdam: a democracia.  Mas que democracia?  Notadamente o público diversificado como ele é, mas ao mesmo tempo uníssono para desejar ‘democracia’ clama pela idealização dela, não sua versão pragmática que a cada momento altera-se para mais ou para menos, mas o mais politicamente correto possível, talvez por um pouco de medo do julgamento alheio.

     Cairia muito bem uma (nem que breve) reflexão que oferece Robert Dahl ao tratar de democracia. Quando a Grécia antiga vivia uma ‘democracia’, quando tudo não poderia ser feito, e participar da vida política era prerrogativa de homens livres e acima de 21 anos, você poderia tomar o impulso e exclamar: Mas isso é democracia? Bem, eles excluíam escravos, mulheres e estrangeiros do processo político, mas definiam seu sistema amplamente democrático tal qual acreditamos que hoje façamos parte de um.
     Muitos outros, inclusive, apoiaram uma hipotética censura ao humor no quesito religião. Essas pessoas que julgam fortalecer um regime democrático agora concordam que deva ser obrigatório não fazer piada e ou não externar livre manifestação sobre religião. Na vida prática seria: Você não poderia ridicularizar nenhuma religião, os governos imporiam um dogma universal e por mais que você não dê a mínima para uma religião, você não pode ‘desrespeitá-la’ e pronto, mas sua convicção pessoal poderia ser arbitrariamente censurada.

     Batizada na igreja católica e adepta do Cristiano sim, mas evidentemente nada me leva a amordaçar alguém se ele quiser fazer ‘picadinho’ da imagem de Cristo enquanto figura fundamental para o catolicismo.  Se assim eu fizer, não estou sendo cristã, estou sendo apenas tirânica e impondo minha crença sobre a opinião de outro individuo. O livre arbítrio é um belo exemplo de direito de escolha, mas perfeitamente espera-se decisões morais dignas.  Por mais que criticar uma religião não seja tido moralmente aceitável, mais imoral é sem dúvida calar a convicção do outro porque você não acredita ser agradável.

     Não, eles não querem liberdade e esse é o nosso maior problema, haja vista ser imprescindível a evolução do pensamento filosófico de cada indivíduo para o aperfeiçoamento da civilização. De outro modo, estamos a passos curtíssimos, quase parados enquanto aqueles espalham verborragia para justificar o retrocesso em forma de respeito. Respeito à tirania que agora dão o nome de ‘politicamente correto’, mas uma extravagância moral que desvirtua o maior sinônimo da evolução humana: a liberdade.